quinta-feira, 26 de novembro de 2020

O Palestra, tio Antônio, Diego e Che

Em algum lugar por aí eu já escrevi que foi meu tio Antônio e sua velha perua Kombi que me apresentaram o estádio Palestra Itália e o Palmeiras, uma das minhas paixões, conforme também já contei numas perdidas linhas como estas.

Mineiro de Passa Quatro, o seu Antônio Ribeiro Mendes era entregador de uma famosa fábrica de queijos. Financiada por terceiros, a intrépida Kombi cheirava queijo até suas entranhas. O Palmeiras era a grande alegria da vida do marido da tia Marcella, meus pais de criação.

Dona Marcella Morandi, italianinha brava e arretada, ficava furiosa quando o palestrino das alterosas subtraia sua banqueta almofadada da velha penteadeira para acomodar um pivete de dez anos junto com dez queijeiros palmeirenses, na velha Kombi, rumo ao santuário Verde.

De pouca escolaridade e instrução, seu Tonho mineiro mal sabia que seu sobrinho e afilhado ia se interessar não só pelo palestra mas por alguns assuntos que ele achava, digamos, meio chatos e enjoativos, política e economia.

E foi na esquerda, política, e no futebol que aprendi a admirar um sujeito canhoto, na bola e na ideologia, que fazia magia com os pés, e com a mão, também, se assim fosse preciso para escrever a verdade dos campos. Que o diga o Império britânico, aquele que se apropriou com mãos e armas das sul-americanas ilhas Malvinas.

Sim, o boleiro “iluminado” Diego Armando Maradona, assim como o ídolo dele, e meu, Che Guevara, não eram cidadãos de bem. Se o seu compatriota portenho dispensa apresentações político-ideológicas, Dieguito, menino pobre da periferia argentina, sempre soube ficar do lado certo da história. O resto é vida e escolha pessoais dele, a quem coube as glórias e infortúnios.

Apenas alguns exemplos aqui da terra brasilis. Maradona revoltou-se e solidarizou-se com ela,quando, num campo de futebol, sua praia, ouviu a presidenta do país, ser xingada, grosseira e covardemente, por bem nascidos pagantes e alienígenas mal educados de um estádio popular. Diferente de seus colegas de pelota daqui, manifestou-se publicamente contra a arbitrária prisão do atual maior líder de esquerda do planeta.

E agora quando anunciam a morte de Diego, irreverente, polêmico, irrequieto e genial, entristecido também lembro do tio Antônio. O meu adorável mestre em futebol e singelo analfabeto em política, que me apresentou o primeiro e, sem saber, por vias tortas, a segunda, assim como aos seus deuses e heróis humanos.

Os maricas, a vacina, a pólvora e o exército tupiniquim

Tenho um certo fetiche em ler os comentários interativos das matérias jornalísticas. Além da visão do colunista acabo conhecendo, também, a opinião dos leitores dele, dos “robôs” e gado, inclusive. Isso sempre ajuda a termos melhor visão do mundo, ou de pelo menos da cegueira de parte dele.

Numa fala recente do presidente da república, aquele da filial da “Trumplândia”, o ilustre afirmou que a república que ele desgoverna tem deixar de ser “um país de maricas” referindo-se à excessiva importância que tem se dado a “gripezinha” que matou mais 162 mil pessoas, no reino dele, em pouco mais de 9 meses.

Na repercussão da imprensa, entre os adjetivos com os quais o autor da frase foi qualificado destacou-se o de homofóbico. A falta de empatia e de humanidade estão tão impregnadas na oração do sujeito que nem cabe discutir. Mas eis que um intrépido leitor de um desses articulistas da mídia o corrigiu asseverando que “maricas podem ser homens e mulheres” logo o presidente dele, e por azar nosso, não manifestou caráter homofóbico.

É de surpreender a capacidade inesgotável que esse gado que segue o Messias tem de justificar o indefensável, qualidade até maior que a do “indefensável” falar asneiras. Sem querer entrar na discussão de que “marica” apesar de ser um adjetivo de 2 gêneros coloquialmente define “o indivíduo do sexo masculino que se comporta com modos femininos”, podemos concluir que o ator canastrão, que ocupa a direção da filial da “Trumplândia”, só exibe tal performance por ter uma sequiosa plateia que têm verdadeiros orgasmos com suas pérolas verbais e “twitais”.

Enquanto isso essa tal plateia “nelore” e os outros que têm que assistir a atuação do Bozo, infelizmente, pelo segundo grupo, esperam por uma vacina, que o “caçador de maricas”, insiste em utilizar, a ausência dela, é claro, como plataforma eleitoral para a reeleição dele no reino dos absurdos. Que este humor, catarse dessa desgraça, não soe, por favor, como desrespeito às vitimas, e familiares dessas, da covid 19.

E parafraseando Vandré, para não dizer que não falei das flores, os mariners que se acautelem o exército tupiniquim prepara o seu ataque com armas, canhões e pólvora, muito provavelmente desconhecendo que assim como a vacina a pólvora também é uma invenção chinesa.